sobre ser quem se é

hoje eu tava assistindo na tv um programa que falava sobre cabelo e tudo que se relaciona. queda, aplique, higiene, tratamentos e afins.
aí, tudo bem, programa legal, não sei o que mais.
a apresentadora tava perguntando ao especialista que tava lá se tinha verdade no mito de pintar os cabelos e isso fazer mal aos fios.
depois de ele responder, eles colocaram no ar uma matéria com uma fotógrafa - nana moraes - que disse que nunca tinha pintado os cabelos 'nem de brincadeirinha', segundo suas próprias palavras. ela é uma mulher bem peculiar: 46 anos, fotógrafa, bem magra, baixinha, cabelos bem curtos e grisalhos.
estranhamente, tudo que ela dizia me chamava muito a atenção. talvez pela casualidade nas palavras ou pelo desinteresse em agradar, eu a achei super agradável e interessante ;D

ela disse que já é clássico que a figura da mulher com cabelos brancos configura desleixo, enquanto homens da linha grecin 5 são os charmosos, o aclamado tipo 'zé mayer'.



explicou que seus cabelos brancos eram uma forma de se manter conectada com seu já falecido pai, que tinha também seus fios descoloridos pelo tempo.
outra coisa que eu achei bem legal é a relação que ela mantém com o trabalho frente a sua própria vaidade. disse que como ela trabalha com a vaidade dos outros, ela deixa a dela se limitar a isso. sua vaidade é não ter vaidade.
no fim da entrevista, ela disse que muitas pessoas já fizeram a esperada sabatina de perguntas: 'por que não deixa o seu cabelo crescer?', 'por que não pinta?', 'por que não coloca silicone?' e, a resposta não poderia ser mais imbatível 'porque aí não sou eu, né?'

eu pensei muito na entrevista. não exatamente na entrevista, mas no que eu captei dela.
pra nana ser essa mulher peculiar, ela teve que contrariar todo um molde, uma classificação já pronta pra usar desde que o mundo é mundo.
o que eu fiquei pensando mesmo é no quanto é difícil ser quem a gente quer ser.
não é muito difícil que um executivo qualquer que trabalha hoje num escritório usando terno e gravata e mencionando palavras sérias pra se fazer entender por aí, no fundo quisesse ser um desses motoqueiros que andam com aquelas motos gigantescas, tatuagens cobrindo 75% de seu corpo, bandanas do metallica, óculos escuros e barbas que serviriam de ninho pra qualquer águia de bom porte.

ser o que se quer ser não se trata só de escolher uma profissão, um meio de vida. se trata de você se permitir reagir do jeito que acha certo, se vestir como te agrada, comer o que você gosta, mesmo quando todo mundo faz cara de nojo.

mas, sim, voltando.
depois da entrevista, assisti 'dan in real life' [no brasil, 'eu, meu irmão e nossa namorada'] e, como eu ainda estava com essa questão existencial na cabeça, eu desconsiderei o desenrolar do filme [que é bem água com açúcar, mas bom, eu indico] e fiquei pensando ainda sobre a mesma coisa. o dan [o steve carell que fez. e fez muito bem] só me ajudou a reforçar tudo o que eu tava pensando antes.
ele é viúvo, pai de 3 meninas e tenta lidar com a independência que elas alcançam sem muito sucesso. num feriado com a família, ele conhece e se apaixona pela namorada do irmão sem saber que ela é quem é, depois passa o filme todo tentando lidar com esse rolo.



olha aí o mesmo problema de novo!
a dificuldade de dizer quem se é, o que se quer.
se fosse simples, ele chegaria pra família toda e diria 'gente, seguinte: eu conheci a marie [o nome dela é marie] sem saber que ela namora meu irmão, mas acontece que eu tô apaixonado por ela, ela por mim e... é isso! vamos ser felizes juntos. beijão, hein!', mas eu acho que o pessoal não ficaria muito satisfeito, especialmente seu irmão.

eu não vou conseguir concluir isso muito bem porque eu acho que não existe conclusão sobre esse tipo de pensamento.
seria uma hipocrisia enorme se eu dissesse 'vamos lá, sejam quem vocês quiserem ser e não se importem com o que as pessoas vão achar' por uma razão pequena: eu também não sou assim :)

se alguém tiver coragem de ser 100% do que é às escondidas, parabéns.
das duas, uma: a pessoa é tão medíocre que ser 100% dela mesma não é ser uma aberração ou ela realmente tem coragem e certamente terá muita história pra contar pros netos.

abraços.